28 de nov. de 2011

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Os 10 melhores começos de livros de autores brasileiros

Car­los Wil­li­an Lei­te | car­loswil­li­an@uol.com.br | @revistabula

Dando sequência à série de melhores começos de livros, perguntei a 20 convidados — escritores, críticos, professores e jornalistas — quais eram os melhores inícios de livros de autores brasileiros. Cada participante poderia indicar até cinco começos, excetuando aqueles que apareceram na primeira lista: “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa; “O Ventre”, de Carlos Heitor Cony; e “O Amanuense Belmiro” de Cyro dos Anjos. 21 livros foram citados, 14 obtiveram mais de uma citação, são eles “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis; “Quase Memória”, de Carlos Heitor Cony; “A Maçã no Escuro”, de Clarice Lispector; “Memórias de um Sargento de Milícias”, de Manuel Antônio de Almeida; “Lavoura Arcaica”, Raduan Nassar; “Deus de Caim”, Ricardo Guilherme Dicke; “Macunaíma”, de Mário de Andrade; “A Morte e a Morte de Quincas Berro D’Água”, de Jorge Amado; “Com Meus Olhos de Cão”, de Hilda Hilst; “O Tempo e o Vento”, de Erico Verissimo; “O Jardim do Diabo”, de Luis Fernando Verissimo; “A Lua Vem da Ásia”, de Campos de Carvalho; e “Dom Casmurro” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis. Abaixo, em ordem aleatória, a lista com os dez livros que obtiveram o maior número de citações.

O Jardim do Diabo
(Luis Fernando Verissimo)

Me chame de Ismael e eu não atenderei. Meu nome é Estevão, ou coisa parecida. Como todos os homens, sou oitenta por cento água salgada, mas já desisti de puxar destas profundezas qualquer grande besta simbólica. Como a própria baleia, vivo de pequenos peixes da superfície, que pouco significam mas alimentam. Você talvez tenha visto alguns dos meus livros nas bancas. Todo homem, depois dos quarenta, abdica das suas fomes, salvo a que o mantém vivo. São aqueles livros mal impressos em papel jornal, com capas coloridas em que uma mulher com grandes peitos de fora está sempre prestes a sofrer uma desgraça.




A Lua Vem da Ásia

(Campos de Carvalho)

Aos 16 anos matei meu professor de lógica. Invocando a legítima defesa – e qual defesa seria mais legítima? – logrei ser absolvido por cinco votos a dois, e fui morar sob uma ponte do Sena, embora nunca tenha estado em Paris. Deixei crescer a barba em pen­samento, comprei um par de óculos para míope, e passava as noites espiando o céu estrelado, um cigarro entre os dedos. Chamava-me então Adilson, mas logo mudei para Heitor, depois Ruy Barbo, depois finalmente Astrogildo, que é como me chamo ainda hoje, quando me chamo.





O Tempo e o Vento

(Erico Verissimo)

‎Era uma noite fria de lua cheia. As estrelas cintilavam sobre a cidade de Santa Fé, que de tão quieta e deserta parecia um cemitério aban­donado. Era tanto silêncio e tão leve o ar, que se alguém aguçasse o ouvido talvez pudesse até escutar o sereno na solidão. Agachada atrás dum muro, José Lírio preparava-se para a última corrida. Quantos passos dali até a igreja? Talvez uns dez ou doze, bem puxados. Recebera ordens para revezar o companheiro que estava de vigia no alto duma das torres da Matriz.



Dom Casmurro
(Machado de Assis)

Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumpri­men­tou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da Lua e dos ministros, e aca­bou recitando-me versos. A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus.
Su­cedeu, porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.


Memórias Póstumas de Brás Cubas
(Machado de Assis)

Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinquenta, nem vinte e, quando muito, dez. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio.


Com Meus Olhos de Cão

(Hilda Hilst)

Deus? Uma superfície de gelo ancorada no riso. Isso era Deus. Ainda assim tentava agarrar-se àquele nada, deslizava geladas cambalhotas até encontrar o cordame grosso da âncora e descia descia em direção àquele riso. Tocou-se. Estava vivo sim. Quando menino perguntou à mãe: e o cachorro? A mãe: o cachorro morreu. Então atirou-se à terra coalhada de abóboras, colou-se a uma toda torta, cilindro e cabeça ocre, e esgoelou: como morreu? como morreu? O pai: mulher, esse menino é idiota, tira ele de cima dessa abóbora.



A Morte e a Morte de Quincas Berro D’Água

(Jorge Amado)

Até hoje permanece certa confusão em torno da morte de Quincas Berro Dágua. Dúvidas por explicar, detalhes absurdos, contradições no depoimento das testemunhas, lacunas diversas. Não há clareza sobre hora, local e frase derradeira. A família, apoiada por vizinhos e conhecidos, mantém-se intransigente na versão da tranquila morte matinal, sem testemunhas, sem aparato, sem frase, acontecida quase vinte horas antes daquela outra propalada e comentada morte na agonia da noite, quando a Lua se desfez sobre o mar e aconteceram mistérios na orla do cais da Bahia.




Macunaíma

(Mário de Andrade)

No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia, tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro: passou mais de seis anos não falando. Sio incitavam a falar exclamava: If — Ai! que preguiça!... e não dizia mais nada.




Lavoura Arcaiaca

(Raduan Nassar)

Os olhos no teto, a nudez dentro do quarto; róseo, azul ou violáceo, o quarto é inviolável; o quarto é individual, é um mundo, quarto catedral, onde, nos intervalos da angústia, se colhe, de um áspero caule, na palma da mão, a rosa branca do desespero, pois entre os objetos que o quarto consagra estão primeiro os objetos do corpo; eu estava deitado no assoalho do meu quarto, numa velha pensão interiorana, quando meu irmão chegou para me levar de volta; minha mão, pouco antes dinâmica e em dura disciplina, percorria vagarosa a pele molhada do meu corpo.




Deus de Caim

(Ricardo Guilherme Dicke)

Na rede Lázaro. Zumbidos. O irmão morto na rede. O mundo rodeando sua roda indiferente. As moscas voavam lentas e pousavam na cara dele. Não se importava, Lázaro morto, narinas paradas. Todos os telégrafos diziam: Lázaro morreu e vai ser enterrado. Para sempre. Antigamente, diziam, havia a ressurreição. Agora não. Agora a sombra que abandona este reino de sombras, caminha para sempre só, num outro reino de sombras ainda mais solitárias. Só, como um rei perdido, só, sem reinado, na essência redonda da morte.


23 de jul. de 2011

Amy Winehouse



A LOUCA

Quando ela passa: - a veste desgrenhada,
O cabelo revolto em desalinho,
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.

Moça, tão moça e já desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário da mágoa sepultada.

Eu sei a sua história. - Em seu passado
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado -

E hoje, para guardar a mágoa oculta,
Canta, soluça - o coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.


E-mail
(Augusto dos Anjos)

*
um dia muito triste pra mim que tive o privilégio de te ter na trilha sonora da minha vida.

-

12 de jul. de 2011

Walking Around - Pablo Neruda



Walking Around - Pablo Neruda

Sucede que me canso de ser hombre.
Sucede que entro en las sastrerías y en los cines
marchito, impenetrable, como un cisne de fieltro
Navegando en un agua de origen y ceniza.

El olor de las peluquerías me hace llorar a gritos.
Sólo quiero un descanso de piedras o de lana,
sólo quiero no ver establecimientos ni jardines,
ni mercaderías, ni anteojos, ni ascensores.

Sucede que me canso de mis pies y mis uñas
y mi pelo y mi sombra.
Sucede que me canso de ser hombre.

Sin embargo sería delicioso
asustar a un notario con un lirio cortado
o dar muerte a una monja con un golpe de oreja.
Sería bello
ir por las calles con un cuchillo verde
y dando gritos hasta morir de frío

No quiero seguir siendo raíz en las tinieblas,
vacilante, extendido, tiritando de sueño,
hacia abajo, en las tapias mojadas de la tierra,
absorbiendo y pensando, comiendo cada día.

No quiero para mí tantas desgracias.
No quiero continuar de raíz y de tumba,
de subterráneo solo, de bodega con muertos
ateridos, muriéndome de pena.

Por eso el día lunes arde como el petróleo
cuando me ve llegar con mi cara de cárcel,
y aúlla en su transcurso como una rueda herida,
y da pasos de sangre caliente hacia la noche.

Y me empuja a ciertos rincones, a ciertas casas húmedas,
a hospitales donde los huesos salen por la ventana,
a ciertas zapaterías con olor a vinagre,
a calles espantosas como grietas.

Hay pájaros de color de azufre y horribles intestinos
colgando de las puertas de las casas que odio,
hay dentaduras olvidadas en una cafetera,
hay espejos
que debieran haber llorado de vergüenza y espanto,
hay paraguas en todas partes, y venenos, y ombligos.
Yo paseo con calma, con ojos, con zapatos,
con furia, con olvido,
paso, cruzo oficinas y tiendas de ortopedia,
y patios donde hay ropas colgadas de un alambre:
calzoncillos, toallas y camisas que lloran
lentas lágrimas sucias.


2 de jul. de 2011

Jim Morrison

"A primeira vez que descobri a morte… eu, os meus pais e os meus avós, íamos de automóvel no meio do deserto ao amanhecer. Um caminhão carregado de índios, tinha chocado com outra viatura e havia índios espalhados por toda a auto-estrada, sangrando. Eu era apenas uma criança e fui obrigado a ficar dentro do automóvel enquanto os meus pais foram ver o que se passava. Não consegui ver nada – para mim era apenas tinta vermelha esquisita e pessoas deitadas no chão, mas sentia que alguma coisa se tinha passado, porque conseguia perceber a vibração das pessoas à minha volta, então de repente apercebi-me que elas não sabiam mais do que eu sobre o que tinha acontecido. Esta foi a primeira vez que senti medo… e eu penso que nessa altura as almas daqueles índios mortos – talvez de um ou dois deles – andavam a correr e aos pulos e vieram parar à minha alma, e eu, apenas como uma esponja, ali sentado a absorvê-las." Jim Morrison

1 de jun. de 2011

Marilyn












Seis meses antes de morrer Marilyn Monroe se despiu para as lentes do fotógrafo Bert Stern (1ª foto) na suíte do badalado hotel Bel Air, em Los Angeles. Neste ensaio foram feitas nada menos que 2.751 fotos entre algumas garrafas de Dom Pérignon. Hoje Norma Jean faria 85 anos.

29 de mar. de 2011

A Writer's Ruminations - Vírginia Wolf



Virginia Woolf’s last letter to her husband, Leonard.

It reads:


Tuesday.

Dearest,

I feel certain that I am going mad again. I feel we can’t go through another of those terrible times. And I shan’t recover this time. I begin to hear voices, and I can’t concentrate. So I am doing what seems the best thing to do. You have given me the greatest possible happiness. You have been in every way all that anyone could be. I don’t think two people could have been happier till this terrible disease came. I can’t fight any longer. I know that I am spoiling your life, that without me you could work. And you will I know. You see I can’t even write this properly. I can’t read. What I want to say is I owe all the happiness of my life to you. You have been entirely patient with me and incredibly good. I want to say that - everybody knows it. If anybody could have saved me it would have been you. Everything has gone from me but the certainty of your goodness. I can’t go on spoiling your life any longer.

I don’t think two people could have been happier than we have been.

V.

22 de fev. de 2011

Bluebird animation based on Charle's Bukowski's poem




Pássaro Azul

Charles Bukowski

em meu coração existe um pássaro azul que

quer sair

mas eu não permito,

eu digo, fique aí, eu não vou deixar

ninguém ver

você.


em meu coração existe um pássaro azul que

quer sair

mas eu dou uísque para ele e jogo

fumaça de cigarro

e as putas e as garçonetes

e as atendentes

nunca sabem que

ele está aqui dentro.


em meu coração existe um pássaro azul que

quer sair

mas eu não permito,

eu digo,

fique quieto, você quer

me ferrar?

você quer fuder meu trabalho?

você quer estragar a venda de meus livros na

Europa?


em meu coração existe um pássaro azul que

quer sair

mas eu sou sabido, eu só deixo ele sair

de vez em quando à noite

quando todo mundo está dormindo.

eu digo, eu sei que você está aí,

não fique

triste.

então eu coloco ele de volta,

mas ele ainda canta um pouco

aqui dentro, eu não deixei ele

morrer totalmente

e nós dormimos juntos desse

jeito

com nosso

pacto secreto

e isto é tão legal que

faz um homem

chorar,

mas eu não choro,

e você?


14 de fev. de 2011

Tom Waits reads Charles Bukowski


The Laughing Heart


sua vida é sua vida

não se deixe abater por essa sua fria submissão

fique atento

existem caminhos por fora

há uma luz em algum lugar

pode não ser muita luz, mas ainda assim ela bate a escuridão

fique atento

os deuses nos oferecem chances

reconheça as

agarre as

você não pode vencer a morte, mas você pode vencer a morte em vida, às vezes

e quanto mais você aprender a fazê-lo, mais luz haverá.

sua vida é sua vida

saiba enquanto você a tem

você é maravilhoso

os deuses esperam pra te dar prazer, satisfação.


Charles Bukowski

22 de jan. de 2011

7 de jan. de 2011

Pour le Parapluie

(foto de Cartier Bresson)
Pelas horas que são
Prometo solemente
Te proteger da chuva
E do sol
E quando anoitecer
Ser teu apoio
Tua bengala
Teu escudo
Ou simplesmente
Pousar delicadamente no teu braço
Mas por favor
nunca me deixe
Sozinho
Numa chapeleira
De um café qualquer...